Basta um feriado prolongado para crescer consideravelmente o número de ocorrências de violência doméstica na região. Sete anos depois que foi promulgada a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), ainda não há um consenso entre as autoridades se as mulheres estão denunciando mais ou se é a violência contra elas que está aumentando. Uma pesquisa realizada pelo Senado Federal, em 2011, mostrou que 66% das brasileiras acham que a violência doméstica e familiar contra as mulheres cresceu, ao mesmo tempo em que 60% acreditam que a proteção contra este tipo de agressão melhorou após a criação da Lei Maria da Penha. Segundo a pesquisa, os principais fatores que contribuem para os casos de violência contra mulher são o machismo (46%) e o alcoolismo (31%).

Além dos simples casos de agressão, o que mais preocupa são os crimes passionais. Nos últimos meses, a região Sudoeste teve vários assassinatos brutais de mulheres. O último deles aconteceu em Pato Branco, dia 24 de março, quando o ex-companheiro matou a mulher com nove facadas nas costas porque ela não queria reatar o relacionamento. O detalhe que mais chamou a atenção é que ela tinha registrado uma denúncia na delegacia contra o suspeito há menos de uma hora, por ter sofrido agressões e ameaça de morte. Essa situação também acendeu a discussão sobre a eficácia das medidas protetivas. A legislação define uma série de medidas, que são elencadas pelo delegado e expedidas pela Justiça — a mais comum delas é a determinação para o agressor deixar a moradia ou não se aproximar da vítima, que vale no papel, mas é difícil colocá-la em prática. No caso de Pato Branco, a medida não foi eficaz para impedir o assassinato.

 

"Punir exemplarmente"

O promotor de Justiça Roberto Tonon Júnior não acredita que esteja ocorrendo aumento dos casos de violência contra a mulher. "O que está ocorrendo, isto sim, é a utilização dos mecanismos da Lei Maria da Penha de forma mais efetiva. A violência doméstica sempre existiu e muito, mas anteriormente as vítimas não tinham vontade de procurar as autoridades, exatamente pelo temor de represálias e por pensar que não dava em nada, porém isso está mudando", entende.

De acordo com ele, a Justiça e a polícia não conseguem estar em todos os lugares ao mesmo tempo, nem tampouco fazer segurança 24 horas por dia de uma pessoa. "O que podemos fazer é aplicar as medidas de proteção e, em caso de descumprimento, aplicar as consequências, que no caso é a prisão preventiva. Agora, se a pessoa descumpre a medida e vai lá e mata a vítima, antes que houvesse a reclamação do descumprimento, não há o que fazer, a não ser punir exemplarmente o agressor."

Segundo o promotor, de janeiro até agora estão em andamento 56 processos criminais envolvendo violência doméstica, além de 483 medidas protetivas e autos de verificação de informações (investigações). Neste mesmo período foram arquivados 170 processos. O arquivamento pode ocorrer por três motivos: desistência da vítima; não comparecimento da mesma à audiência preliminar; e falta de provas mínimas para o oferecimento de denúncia. Os processos em andamento são aqueles em que a vítima quis processar o agressor e existiam provas suficientes para iniciar o processo criminal, com o oferecimento de denúncia. 

 

Aumento de 16,5% nas ocorrências

Na microrregião de Francisco Beltrão, que compreende 27 municípios, foram registrados no ano passado 936 casos de violência doméstica e familiar. Uma média de 2,5 casos de agressão contra mulher por dia. Os dados demonstram um crescimento de 16,5% com relação ao ano anterior, quando a polícia computou 803 ocorrências. A microrregião de Pato Branco, que teve índices altos no passado, apresentou ligeira queda com relação ao ano de 2011. Foram registrados 717 casos, uma redução de 4,9%. As informações são da Secretaria de Estado e Segurança Pública.

O delegado adjunto da 19ª SDP, Wellington Yuji Daikubara, diz que percebe no dia a dia da delegacia aumento nos casos de ameaça e injúria. "Aquela violência mais grave, quando há agressão física, espancamento ou tentativa de homicídio, não podemos dizer que aumentou. As mulheres de fato estão mais antenadas com a lei e quando se sentem humilhadas então procuram pelas medidas protetivas, porque sabem que a Justiça atende rapidamente estes casos."

O delegado ressalta que é difícil saber qual caso de ameaça vai evoluir para uma tentativa de homicídio ou um homicídio consumado. Do mesmo modo, ele observa que há casos em que a mulher está se aproveitando da legislação para se livrar do marido. "Já registramos situações em que a mulher tem uma pequena discussão com o marido e procura a delegacia para pedir o afastamento do companheiro. Na sequência pede o divórcio e, como ele não está mais junto, acaba ficando com a casa depois da separação."

 

Mulher tem que avisar quando o agressor se aproximar

Na 19ª Subdivisão Policial (SDP), em 2010, os casos de violência contra a mulher resultaram em 240 inquéritos e 27 medidas protetivas; em 2011, 149 inquéritos e 288 medidas protetivas; 2012, 194 inquéritos e 277 medidas protetivas. Em 2013, no primeiro trimestre, já foram expedidas 81 medidas protetivas. A escrivã Adriana Becker afirma que as medidas protetivas são importantes e já ajudaram a evitar muitos outros crimes. "A mulher tem que ligar para a polícia e avisar se o agressor se aproximar dela, que ele vai preso."

 

Homem não sabe lidar com a separação

O psicólogo e psicanalista Érico Peres Oliveira observa que os casos extremos de violência contra a mulher estão interligados, invariavelmente, com o rompimento da relação ou traições. Nem sempre é fácil para o homem aceitar o fim de um relacionamento e as consequências podem ser trágicas. "Faz parte das insígnias do masculino a virilidade. Algo que é transmitido de pai para filho e situa esse indivíduo como homem. No momento de um término ou traição, é esse pilar que fica abalado. A dor dessa separação acaba sendo insuportável, trazendo consequências impensadas."

O psicólogo reforça que a mulher deve tomar cuidado na hora de escolher o parceiro. "Desde os primeiros encontros já é possível perceber, por exemplo, o grau de ciúme do indivíduo." Na avaliação dele, as mudanças que a sociedade contemporânea vem sofrendo em relação aos avanços da mulher ainda são muito recentes. "Evidentemente, é necessário mais tempo para que essas raízes se tornem mais profundas. Logo, a relação entre o homem e a mulher de hoje é muito diferente daquela de antigamente. O homem que possui essa herança machista sofre para se adaptar a essa nova formatação, buscando, assim, uma mulher que se encaixe nos moldes mais antigos. O relacionamento afetivo atual requer o respeito para com a individualidade do outro. Não existe mais a soberania de um ou outro sexo."